quinta-feira, 31 de maio de 2018

A DETERMINAÇÃO PARA A ESPIRITUALIDADE





O yoga Ramakrishna ilustra, com uma parábola, a intensidade do desejo que precisamos ter:

O mestre levou o discípulo para perto de um lago.
- Hoje vou ensiná-lo o que significa a verdadeira devoção – disse.
Pediu ao discípulo que entrasse com ele no lago, e segurando a cabeça do rapaz, colocou-a debaixo d’água. 
O primeiro minuto passou. No meio do segundo minuto, o rapaz já se debatia com todas as forças para livrar-se da mão do mestre, e poder voltar a superfície
.
No final do segundo minuto o mestre soltou-o. O rapaz, com o coração disparado levantou-se, ofegante.
- O Sr. quis matar-me! – gritava.

O mestre esperou que ele se acalmasse, e disse:
- Não desejei matá-lo – porque se desejasse, você não estaria mais aqui. 

Queria apenas saber o que sentiu, enquanto estava debaixo d’água.
- Eu me senti morrendo! Tudo que desejava na vida era respirar um pouco de ar!

- É exatamente isso. A verdadeira devoção só aparece quando só temos somente uma vontade, e morreremos se não conseguirmos realizá-la.



quarta-feira, 30 de maio de 2018

SAMSARA




Durante uma conversa, o rei Milinda, que questionava sobre os ensinamentos de Buda,perguntou ao sábio Nagasena:
— O que é o samsara?

Nagasena respondeu:
— Ó grande rei, aqui nascemos e morremos, lá nascemos e morremos, depois nascemos de novo e de novo morremos, nascemos, morremos... Ó grande rei, isso é samsara.

Disse o rei:
— Não compreendo. Por favor, explique com mais clareza.
Nagasena replicou:
— É como o caroço de manga que plantamos depois de comer a fruta. Quando a grande árvore cresce, ela dá frutos, as pessoas os comem para, em seguida, plantar os caroços. E dos caroços nasce uma grande mangueira, que dá frutos. Desse modo, a mangueira não tem fim. É assim, grande rei, que nascemos aqui, morremos ali, nascemos, morremos, nascemos, morremos. Grande rei, isso é samsara.

Em outro momento, o rei Milinda perguntou:
— O que renasce no mundo seguinte (depois da morte)? Nagasena responde:
— Depois da morte nascem o nome, a mente e o corpo.

O rei perguntou:
— É o mesmo nome, a mesma mente e o mesmo corpo de agora que nascem depois da morte?
— Não é o mesmo nome, a mesma mente e o mesmo corpo que nascem depois da morte. Esse nome, essa mente e esse corpo criam a ação. Pela ação, ou carma, nascem outro nome, outra mente e outro corpo.

Noutro momento, o rei Milinda passeava à beira de um lago coberto por flores de lótus e refletia sobre os ensinamentos de Buda. Uma dúvida surgiu e ele pediu que chamassem Nagasena. Quando Nagasena chegou, o rei perguntou:
— O que resta quando o eu desvanece?

Nagasena, comovido, apontou para o lago coberto de lótus.

O rei Milinda despertara


sábado, 26 de maio de 2018

A LUA





Um monge aproximou-se de seu mestre — que se encontrava em meditação no pátio do templo à luz da lua — com uma grande dúvida:

Mestre, aprendi que confiar nas palavras é ilusório. O verdadeiro sentido surge através do silêncio. Mas vejo que os sutras e as recitações são feitos de palavras e que o ensinamento é
transmitido pela voz.

Se o Darma está além das palavras, por que as usamos para explicá-lo?

O velho sábio respondeu:
As palavras são como o dedo apontando para a Lua. Olhe para a Lua, não se preocupe com o dedo que a aponta.

O monge replicou:
Mas eu não poderia olhar a Lua sem precisar de um dedo que a indicasse?
Poderia — confirmou o mestre —, e assim o fará, pois ninguém mais pode olhar a lua por você.

As palavras são como bolhas de sabão: frágeis e inconsistentes, desaparecem quando em contato prolongado com o ar. A Lua está e sempre esteve à vista.

O Darma é sempre presente e completamente revelado. As palavras não podem revelar o que já está revelado desde o Primeiro
Princípio.

Então — o monge perguntou —, por que os seres humanos precisam que seja revelado o que já é de seu conhecimento?

Porque — completou o sábio —, da mesma forma que ver a Lua todas as noites faz com que as pessoas se esqueçam dela pelo simples costume de aceitar sua existência como fato consumado,
assim também as pessoas não confiam na verdade já revelada pelo simples fato de ela se manifestar em todas as coisas, sem distinção.

Dessa forma, as palavras são um subterfúgio, um adorno para embelezar e atrair nossa atenção. E, como qualquer adorno, pode ser valorizado mais do que o necessário.

O mestre ficou em silêncio durante muito tempo. Então, de súbito, simplesmente apontou a lua.




segunda-feira, 14 de maio de 2018

O APRENDIZ DE MESTRE






O primeiro-ministro da Dinastia Tang era um herói nacional pelo seu sucesso tanto como homem de Estado quanto como líder militar.

Mas, a despeito de sua fama, poder e riqueza, ele se considerava um humilde e devoto buddhista.

Freqüentemente ele visitava seu Mestre Zen favorito para estudar com ele, e eles pareciam se dar muito bem.

O fato de ser era primeiro-ministro aparentemente não tinha efeito em sua relação, que parecia ser simplesmente a de um reverendo Mestre e seu respeitoso estudante.

Um dia, durante sua visita usual, o primeiro-ministro perguntou ao Mestre: — Mestre, o que é o egoísmo, de acordo com o Buddhismo?

O rosto do Mestre ficou vermelho, e num tom de voz extremamente desdenhoso e insultuoso, gritou em resposta:
— Que tipo de pergunta estúpida é esta?

Tal resposta, tão inesperada, chocou tanto o primeiro-ministro, que, imediatamente, arrogante e com raiva, retorquiu:
— Como ousa me tratar assim?

Neste momento, o Mestre Zen sorriu e disse: — Isto, Excelência, é egoísmo!




domingo, 13 de maio de 2018

O PRESENTE



Certa vez existiu um grande guerreiro. Ainda que muito velho, ele ainda era capaz de derrotar qualquer desafiante. 

Sua reputação estendeu-se longe e amplamente através do país e muitos estudantes reuniam-se para estudar sob sua orientação.

Um dia um infame jovem guerreiro chegou à vila. Ele estava determinado a ser o primeiro homem a derrotar o grande mestre. Junto à sua força, ele possuía uma habilidade fantástica em perceber e explorar qualquer fraqueza em seu oponente, ofendendo-o até que a este perdesse a concentração.


Ele esperaria então que seu oponente fizesse o primeiro movimento, e assim revelando sua fraqueza, e então atacaria com uma força impiedosa e velocidade de um raio. 

Ninguém jamais havia resistido em um duelo contra ele além do primeiro movimento.


Contra todas as advertências de seus preocupados estudantes, o velho mestre alegremente aceitou o desafio do jovem guerreiro. 

Quando os dois se posicionaram para a luta, o jovem guerreiro começou a lançar insultos ao velho mestre. Ele jogava terra e cuspia em sua face.


Por horas ele verbalmente ofendeu o mestre com todo o tipo de insulto e maldição conhecidos pela humanidade. Mas o velho guerreiro meramente ficou parado ali, calmamente. 

Finalmente, o jovem guerreiro finalmente ficou exausto. 

Percebendo que tinha sido derrotado, ele fugiu vergonhosamente.


Um tanto desapontados por não terem visto seu mestre lutar contra o insolente, os estudantes aproximaram-se e lhe perguntaram: “Como o senhor pôde suportar tantos insultos e indignidades? Como conseguiu derrotá-lo sem ao menos se mover?”


“Se alguém vem para lhe dar um presente e você não o aceita,” o mestre replicou, “para quem retorna este presente"?


sábado, 12 de maio de 2018

A RATOEIRA


Um rato, olhando pelo buraco na parede, vê o fazendeiro e sua esposa abrindo um pacote. Pensou logo no tipo de comida que poderia haver ali. Ao descobrir que era uma ratoeira ficou aterrorizado. Correu ao pátio da fazenda advertindo a todos:
- Há uma ratoeira na casa, uma ratoeira na casa!
A galinha, disse:
- Desculpe-me Sr. Rato, eu entendo que isso seja um grande problema para o senhor, mas não me prejudica em nada, não me incomoda.
O rato foi até o porco e lhe disse:
- Há uma ratoeira na casa, uma ratoeira!
- Desculpe-me Sr. Rato, disse o porco, mas não há nada que eu possa fazer, a não ser rezar. Fique tranqüilo que o senhor será lembrado nas minhas preces.
O rato dirigiu-se então à vaca. Ela lhe disse:
- O que Sr. Rato? Uma ratoeira? Por acaso estou em perigo? Acho que não!
Então o rato voltou para a casa, cabisbaixo e abatido, para encarar a ratoeira do fazendeiro. Naquela noite ouviu-se um barulho, como o de uma ratoeira pegando sua vítima. A mulher do fazendeiro correu para ver o que havia pego. No escuro, ela não viu que a ratoeira havia pego a cauda de uma cobra venenosa. E a cobra picou a mulher...
O fazendeiro a levou imediatamente ao hospital. Ela voltou com febre. Todo mundo sabe que para alimentar alguém com febre, nada melhor que uma canja de galinha. O fazendeiro pegou seu cutelo e foi providenciar o ingrediente principal. Como a doença da mulher continuava, os amigos e vizinhos vieram visitá-la. Para alimentá-los o fazendeiro matou o porco. A mulher não melhorou e acabou morrendo. Muita gente veio para o funeral. O fazendeiro então sacrificou a vaca, para alimentar todo aquele povo.
Na próxima vez que você ouvir dizer que alguém está diante de um problema e acreditar que o problema não lhe diz respeito, lembre-se que, quando há uma ratoeira na casa, toda a fazenda corre risco. O problema de um é problema de todos.


PAGANDO A MESMA CONTA TRES VEZES


Conta uma lenda da região do Punjab que um ladrão entrou numa fazenda e roubou 200 cebolas. Antes de conseguir fugir, foi preso pelo dono do lugar, que o levou diante do juiz.
O magistrado pronunciou a sentença: pagar dez moedas de ouro. Mas o homem alegou que era uma multa muito alta, e o juiz, então, resolveu oferecer-lhe mais duas alternativas: receber 20 chibatadas, ou comer as 200 cebolas.
O ladrão resolveu comer as 200 cebolas. Quando chegou na vigésima quinta, seus olhos estavam inchados de tanto chorar, e o estômago queimava como o fogo do inferno. Como ainda faltavam 175, e viu que não aguentaria o castigo, pediu para receber as 20 chibatadas.
O juiz concordou. Quando o chicote bateu em suas costas pela décima vez, ele implorou para que parassem de castigá-lo, porque não suportava a dor. O pedido foi obedecido, mas o ladrão teve que pagar as dez moedas de ouro.
“Se você aceitasse a multa, teria evitado comer as cebolas, e não sofreria com o chicote”, disse o juiz. “Mas preferiu o caminho mais difícil, sem entender que, quando se faz algo errado, é melhor pagar logo e esquecer o assunto.


quarta-feira, 9 de maio de 2018

O CAVALEIRO E A DECRÉPITA






Era uma vez um cavaleiro andante, muito belo que passeava numa floresta,

Numa determinada parte do caminho, ele encontrou uma velha muito feia que estava caída e chorava muito, por ter torcido o pé de forma violenta.

- o que aconteceu? senhora – perguntou o cavaleiro

- vim até a floresta para colher ervas curativas e não percebi esse buraco. Enfiei o pé e o torci,,, Não consigo andar e estou aqui há horas. – disse a velha senhora

- Deve estar com fome? - perguntou o cavaleiro

-Vou ajuda-la a montar em meu cavalo e a levarei até a corte onde algum curandeiro a ajudará e também onde a Sra. poderá se alimentar. – disse o cavaleiro – e assim o fez.

Ao chegar na corte, a velha senhora teve seus pés enfaixados com unguento, o que permitiu a ela voltar a  caminhar.

A noite o cavaleiro condoído, convidou a velha senhora a se juntar no belo banquete no salão principal do castelo.

Porém, ao vê-la comer, o cavaleiro ficou envergonhado com os seus modos e a forma com que comia, parecendo um bicho. Ele pensou: amanhã ela estará melhor e a mandarei ir embora.

Após o jantar, todos recolheram a seus aposentos, porém dada a quantidade de pessoas que vieram para os festejos do rei, uma convidada inesperada não tinha onde ficar.

Foi assim que a velha senhora teve que dormir no mesmo aposento que o cavaleio, porem seria apenas por uma noite, e no dia seguinte essa historia teria terminado, pensava ele.

Os seus companheiros, no entanto, não se cansaram de fazer chacota com seu colega de armas, dizendo que nenhum cavaleiro esteve com mulher tão linda nos seus aposentos.

O que eles não sabiam, é que estavam certos!

Ao entrarem no dormitório a velha mulher transformou-se numa linda donzela perfumada e sensual.

O cavaleiro assustado disse:

- o que está havendo¿ você é uma bruxa¿

- Não - nobre cavaleiro -  muito pelo contrario, fui vitima de um maldoso feiticeiro, por tê-lo rejeitado. Ele me lançou uma maldição que durante o dia eu seria um velha decrepita e retorcida., e a noite diante dos olhos de um único homem, eu voltaria novamente a ter minha bela aparência. Porém se houver mais uma testemunha a me ver, ou se o feitiço for revelado a mais de uma pessoa por vez, eu me transformarei  eternamente numa velha horrorosa. E assim eu estaria condenada a não saber o que é o amor.

O cavaleiro por sua vez, acolheu a bela jovem em seus braços, e teve a mais fantástica noite de amor que já havia experimentado.

No outro dia, no momento de manda-la embora, o cavaleiro recordou-se da noite anterior e revolveu mantê-la na corte por mais uma noite.

Durante o dia, ele caminhava com a velha senhora, e descobriu o quanto ela era interessante, e pode-lhe conhecer a alma.

A noite, mais um jantar e as mesmas piadas e zombarias.

De volta aos aposentos o cavaleiro e a jovem donzela se descobriram num romance digno de um conto de fadas.

E isso se repetiu durante os festivais que celebravam o aniversario do rei.

O Rei porém o advertiu do constrangimento que acontecia diante dos amigos.

O cavaleiro proibido de contar do seu segredo, pois se o fizesse, ela ficaria como velha decrépita para sempre, não sabia o que dizer.

Naquela noite, se amaram como nunca. O cavaleiro teve a certeza então que descobrira o amor de sua vida.

Mas ao voltar ao convívio com os membros da corte, pairava uma sensação de desconforto, ainda que as piadas tivessem diminuído.

Os olhares de reprovação foram demais para o cavaleiro que mandou a sua amada embora.

O tempo passou, o cavaleiro entregou-se a bebida e ao desleixo, já não era mais o mesmo. 

A tristeza e a melancolia eram visíveis em seus olhos, embora ele tentasse a todo custo disfarçar.

Aquela oportunidade passou, assim como passou o tempo, assim como passou a vida que fora entregue ao desalento.

Seus companheiros nunca entenderam o estranho amor dele por aquela velha senhora decrépita.




domingo, 6 de maio de 2018

SIBILA DE CUMAS





As sibilas eram profetisas com vários  altares no mundo grego e romano. Em estado de transe, elas emitiam sons inarticulados “traduzidos” a seguir pelos sacerdotes em profecias.

Para os romanos, a mais famosa dentre as profetisas foi a Sibila de Cumas, que habitava uma caverna perto de Nápoles. Famosa por sua astúcia, ela no entanto, falhou consigo mesma.

Em Cumas é que Apolo, o deus das profecias, a procura, a encontra, não esconde a admiração e a deseja.

Ela então, aproveitando do desejo do deus,  escolhe ser a sumo-sacerdotisa não a amante do deus e pede a ele um dom: diante do deus ela toma, no côvado das mãos, toda a areia de praia que pode segurar e diz querer viver tantos anos quantos grãos de areia houver ali.

O deus não discute: será muito bom para ele tê-la por mais tempo, cuidando de seus templos.

O deus  lhe concede a medida mais longeva da vida humana, isto é, lhe concede 990 anos de vida. Este número representa o símbolo de uma longevidade mítica.

Mas a Sibila esquecera um detalhe: Sibila não pede a permanência da juventude e então ela encolhe, emurchece, transforma a pele num pregueado de lama esturricada, uma velha decrépita.

Somente os olhos e a voz permanecem potentes.

Conta-se que, para que o vento não a carregue e os animais domésticos não a devorem, ela é posta dentro de uma gaiola, transformada numa cigarra que venceu o tempo e que continua, com seus olhos e voz potente a antecipar as sina, mas todos, em volta, morrem.

Só a Sibila de Cumas não morre. Cem anos, trezentos anos, oitocentos anos, até a dor já passou além da dor, e a Sibila de Cumas não morre.

Conta Ovídio que, nas noites quentes da Campânia, as crianças ouviam a voz potente lamentar sua longa e velha vida.

E as crianças, em algazarra, perguntavam: Sibila, o que anseias? E, em meio aos mais pungentes lamentos, a voz sussurrava:
- Ah, eu, anseio morrer.




quinta-feira, 3 de maio de 2018

CULPA



Um dos monges de Sceta disse ao Abade Mestre: 
-Minha língua vive me causando problemas. 
Quando estou no meio dos fiéis, não consigo me controlar - e termino condenando suas ações erradas.

 O velho abade respondeu ao irmão aflito: 
-Se você acha que não é capaz de controlar-se, largue o ensino e retorne ao deserto. 
Mas não se iluda: escolher a solidão para fugir de um problema, é sempre uma prova de fraqueza. 

-O que devo fazer? 

 -Admita alguns erros, para evitar a perniciosa sensação de superioridade. E acerte em tudo que puder acertar.


quarta-feira, 2 de maio de 2018

UM POUCO DE ZEN




A relação mestre-discípulo
Uma relação mestre-discípulo, no Zen, uma relação em que escolhemos alguém para ser nosso mestre na vida e essa escolha deve demorar, não deve ser apressada.

Normalmente os alunos visitam vários lugares, ouvem diferentes pessoas até encontrar um local onde se sentem conectados, se sentem bem, sentem que aquele lugar fala ao seu coração, que aquele professor especificamente está falando ao seu coração.

Depois de um tempo bastante variável, pode ser que se estabeleça uma relação mestre-discípulo e nessa relação não existe uma atitude crítica e, sim, uma aceitação ampla daquilo que está sendo ensinado, com um mínimo de resistência.

Três características definem o discípulo: silente, obediente e não resistente. Silente, significa que ele ouve e fecha sua boca, é silencioso, mesmo que não concorde com algo, fecha sua boca na esperança de que mais tarde entenda aquele ensinamento. Agora não entende, mas, não protesta, fica silente.

Obediente significa que quando o mestre diz “Faça isso!”, o discípulo vai e faz, não importa se a ordem é coerente ou não. Às vezes, os mestres pedem coisas que parecem sem sentido, por exemplo: “Limpe essa sala”, e o discípulo olha e a sala está imaculadamente limpa, mas ele vai lá limpar. Significa que ele não protesta, nem pensa se tem sentido ou não fazer aquela prática que o mestre está lhe pedindo. O discípulo não contesta, ele simplesmente assume a tarefa.

Existem histórias de mestres do passado mandando o discípulo construir uma torre e depois de pronta, desmontá-la, e depois construir novamente. Numa célebre história isso acontece oito vezes. É preciso ter plena consciência do que é obediência não resistente para pegar um regador e ir regar o jardim sob a chuva, por exemplo. Evidentemente, todos podem se dar conta de que tem que haver absoluta confiança na relação mestre-discípulo para se fazer esse tipo de prática, porque ela, dentro de si mesma, tem riscos.

Normalmente, no Zen as instruções são de práticas gerais.
São instruções de prática ritual: “Faça assim!” – não há um espaço para questionamentos do tipo “Por que quando o professor passa atrás de mim eu tenho que fazer gasshō?”. Você tem que descobrir sozinho. Na relação mestre-discípulo, a obediência ocupa um lugar central porque exige o abandono do pensamento centrado em si mesmo, em seu ego.

“Não resistente” aparece frequentemente nos mosteiros porque a palavra mais frequente utilizada pelos monges em treinamento é “hai”, que significa “sim”. É a palavra que mais se ouve, porque a todo o momento em que um veterano ou um mestre diz algo, você responde: “Hai!”. E você diz sim para mil coisas, sempre sem protestar, sem apresentar uma nova consideração ou uma opinião.

Uma ordem é dada: “Faça isso!”, e não existe espaço para “Mas, por que eu de novo, por que não fulano?”. Isso é frequente em muitas situações da vida, mas no mosteiro você aprende a dizer somente “Hai!” e simplesmente realizar sua tarefa sem pensar. Por exemplo, digamos que amanhã é esperada, segundo a previsão, muita neve, e é preciso que alguém acorde às três horas da manhã para tirar a neve do caminho para que se possa chegar à sala de meditação. 

Então, os monges fulano, beltrano e cicrano foram os escolhidos.  Qualquer um poderia ter vontade de se dizer resfriado, ou que é velho, ou que já fez esta tarefa ontem, ou ainda que é fraco, enfim, mil desculpas poderiam ser dadas, mas, nada disso pode ser feito.

Os escolhidos simplesmente se levantam às três horas e vão tirar a neve do caminho. Outro dia outros farão a tarefa e pode ser que neve de novo justamente quando for novamente a sua vez! O sentido disso é aceitação, nós temos que aceitar a vida como ela se apresenta, sem tentar mudar as coisas que não podemos mudar, devemos simplesmente aceitar.

Quando o mestre está presente nós nos comportamos com infinito respeito. Lembro-me de uma pergunta feita à Moriyama Rōshi, sobre sua relação com seu professor, de mais de vinte anos: “Como foi isso?”. Ele respondeu: “Durante vinte anos eu peguei seus chinelos!”. Quando o mestre sai da sala, o aluno principal, o “Jisha”, pega seus chinelos e os coloca na frente da porta, para que quando ele sair seja mais fácil de calçá-los.

Não há gentileza que você não faça e isso faz parte da prática espiritual. Você ouve todas as coisas com completa aceitação e também você tem a postura respeitosa.

Na presença do mestre sempre se deve estar em “shashu” ** jamais estar sentado se ele estiver de pé e não se deve ensinar nada para alguém na presença do mestre, você só ensinará algo se ele pedir.

É você que faz o mestre, não é ele que se faz, ele só é mestre porque tem discípulo. Não é uma via de mão única, é uma via de mão dupla. Você só consegue ter um mestre se você o vir como mestre. Se você não o vir como mestre ele será uma pessoa comum.
Hai!


**  Shashu, postura que se adota quando parado ou em kinhin (“meditação” andando).







terça-feira, 1 de maio de 2018

NADA EXISTE





YAMAOKA TESSHU, quando um jovem estudante Zen, visitou um mestre após outro. 

Ele então foi até Dokuon de Shokoku. Desejando mostrar o quanto já sabia, ele disse, vaidoso: "A mente, Buddha, e os seres sencientes, além de tudo, não existem. A verdadeira natureza dos fenômenos é vazia. Não há realização, nenhuma delusão, nenhum sábio, nenhuma mediocridade. Não há o Dar e tampouco nada a receber!" 

Dokuon, que estava fumando pacientemente, nada disse. 

Subitamente ele acertou Yamaoka na cabeça com seu longo cachimbo de bambu. 

Isto fez o jovem ficar muito irritado, gritando xingamentos. "Se nada existe," perguntou, calmo, Dokuon, "de onde veio toda esta sua raiva?" 



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