Quando tentei tirar a máscara, estava colada à cara. (F.Pessoa)
É incrivel o quanto estamos nos afirmando a todo a tempo. Afirmando a nossa felicidade, a nossa sexualidade, as nossas opiniões, a nossa vaidade, a pretensa beleza.
Pedimos o reconhecimento e aceitação dessas questões mostrando o que achamos que as pessoas querem.
Aprendemos isso desde cedo, pois nos é colocado muitas coisas. Dentre elas que temos que ser os melhores, e através disso seremos felizes. Ficamos então nos comparando a todo momento com as outras pessoas para avaliarmos "quem é o melhor", como se isso fosse possível. Sob qual criterios essas comparações são feitas? O que é felicidade? A felicidade é uma questão individual e pessoal ou existe um lugar comum a todos? Que corrida é essa cuja linha de chegada não sabe onde está?
Passamos então a colocar as nossas expectativas nas mascaras que usamos e que não é a nossa essencia. Passamos a viver uma vida hipócrita, sendo hipócrita e na maioria das vezes não temos a consciencia disso. Como compôs sabiamente o cantor Zé Ramalho: " Vida de gado, povo marcado, povo feliz". Felicidade ilusória pois distancia da nossa alma e da nossa essencia e temporariamente sentimos essa tal felicidade nos comportando como a grande massa até que um dia abrimos os olhos.
O resultado disso é um vazio d'alma que bate a cada conquista do ego. A mascara ganha, a alma perde. Não somos o mundo, somos um individuo no mundo. Ao nos compararmos com os outros e vivermos sob os valores das outros pessoas, nós nos despersonalizamos e podemos perder a nossa identidade. Não raro as crises existencias de "quem sou eu" e "pra onde vou", mas para responder essas preguntas é necessário aprofundar em si mesmo, coisa que o "Eu Mascarado" se recusa fazer.
A nossa centelha divina está no mais intimo e profundo de cada pessoa, e não tem como chegarmos a ela se não mergulhamos em nós. O problema é que a superfecialidade é o lugar comum do "Eu mascarado" que não quer se aprofundar. Como Lúcifer, quer o lugar de Deus mas sem fazer a peregrinação de se tornar divino.
"Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza."
(F.Pessoa)
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